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sexta-feira, maio 30, 2008

O Pequeno Buda/Little Buddha (1993)

Origem: França/Reino Unido

Duração: 135 minutos

Realizador: Bernardo Bertolucci

Com: Keanu Reeves, Ying Ruocheng, Bridget Fonda, Chris Isaak, Alex Wiesendanger, Raju Lal, Greishma Makar Singh, Sogyal Rinpoche, Khyongla Rato Rinpoche, Geshe Tsultim Gyelsen, Jo Champa, Jigme Kunsang

Introdução

O filme que ora se vai analisar encontra-se incluído na rubrica deste blogue denominada “Cunho da Ásia”.


"Siddhartha Gautama"
Sinopse
O idoso Lama “Norbu” (Ying Ruocheng), um respeitado monge budista que vive no mosteiro Paro no Butão, visa encontrar a reencarnação do seu amado professor, o Lama “Dorje” (Geshe Tsultim Gyelsen). Ao fim de 9 anos, recebe um telegrama animador de “Kenpo Tenzin” (Sogyal Rinpoche), um monge que se encontra estabelecido nos Estados Unidos, na cidade de Seattle. Pelos vistos existe uma criança chamada “Jesse Conrad” (Alex Wiesendanger), que reúne indícios que a tornam um forte candidato a ser a reencarnação do Lama “Dorje”. “Norbu” decide então viajar até aos Estados Unidos, no intuito de conhecer o rapaz.

"Jesse Conrad e Lama Norbu"

Quando “Jesse” entra em contacto com o “Norbu” e os restantes monges, fica fascinado com o saber e tradição budistas, mas o seu entusiasmo não é partilhado pelos seus pais “Dean” (Chris Isaak) e “Lisa” (Bridget Fonda). A tensão sobe ainda mais quando “Norbu” pede aos progenitores para levar “Jesse” ao Butão, a fim de ser testado no que concerne à possibilidade da criança ser a reencarnação do seu mentor. A opinião de “Dean” muda radicalmente quando o seu melhor amigo falece num trágico acidente, fazendo-o aperceber da precaridade da vida. Resolve então aceder aos desejos de “Norbu”, e viaja com o filho para o pequeno país dos Himalaias. Pelo caminho são recolhidas mais duas crianças que poderão ser candidatos à reencarnação do Lama “Dorje”. Em conjunto, o grupo enceta uma demanda pessoal que mudará para sempre as suas vidas.

Paralelamente ao acima veiculado, recuamos cerca de 2500 anos e seguimos a história da vida do príncipe Siddhartha Gautama (Keanu Reeves), desde os seus tempos de ócio no palácio do seu pai, e subsequentemente pelo seu posterior e penoso caminho pessoal até se tornar em Buda, o Iluminado.

"O príncipe Siddhartha em todo o seu esplendor"

"Review"

O afamado realizador italiano Bernardo Bertolucci, na sua importante filmografia, possui duas películas intimamente ligadas ao continente asiático. Uma delas e a que nos ocorre logo à mente é “O Último Imperador”. A outra é este “Pequeno Buda”. Em ambas as longas-metragens são expostos aspectos extremamente importantes no contexto do grande continente. No primeiro filme podemos acompanhar a história do último imperador chinês Puyi, acompanhada de aspectos laterais importantíssimos e bastante informativos, tais como a queda do monarca e a implantação do regime republicano. A experiência resultou bem, e a prova é que esta longa-metragem marcou uma época e venceu nada mais, nada menos que 9 óscares. A segunda e posterior incursão de Bertolucci pela temática asiática já foi um tanto ou quanto diferente. Visando oferecer uma apologia do Budismo e indirectamente da causa tibetana (que eu também sufrago, de certa forma), a película foi um fracasso comercial, não tendo vencido nenhum prémio de relevo, para além da aceitação por parte da crítica não ter sido a melhor. É justo que assim o tenha sido? Já vos digo a minha opinião.

Como se depreende da sinopse, quando analisamos “Pequeno Buda”, estamos perante a tarefa de expôr ideias acerca de duas histórias separadas no tempo por cerca de 2500 anos. No entanto, e através de uma análise mais cuidada, sempre se dirá que existirá um ponto de contacto fundamental entre as narrativas paralelas, porquanto ambas têm como ponto central uma demanda extremamente pessoal. O Lama “Norbu”, uma fictícia figura de vulto no universo budista actual e homem de crenças profundas, prossegue o objectivo fulcral de descobrir a reencarnação do seu mestre. A sua persistência, fá-lo sair do seu mosteiro no inóspito Butão, e viajar até uma nação completamente antagónica no estilo de vida, os EUA. Por outra via, é-nos apresentada uma das mais importantes epopeias religiosas da humanidade. Nada mais, nada menos que a lenda do príncipe Siddharta Gautama, mais conhecido por Buda, o Iluminado, mentor de uma religião (ou usando uma designação preferida por muitos, “filosofia de vida”) professada por cerca de 500 milhões de pessoas em todo o mundo. A interligação entre as duas tramas é essencialmente feita pelo interesse de “Jesse”, quando é confrontado com a possibilidade de ser uma figura importante de uma crença que lhe é completamente alheia e desconhecida. O jovem, com a curiosidade própria de uma criança, desvenda os segredos do budismo e sente-se atraído pelo misticismo e espiritualidade de Siddhartha Gautama.

"Jesse rodeado dos jovens monges budistas"

O forte de “Pequeno Buda” não é um facto consumado. É mais uma tentativa de algo. Não existem dúvidas que Bertolucci tenta homenagear o budismo, através de uma mensagem ideológica muito acentuada, que reputo de extremamente positiva. Contudo, e salvo melhor opinião, ficou-se um tanto ou quanto pelas intenções. É certo que sentimos a aura maravilhosa da religião, cujo ponto mais forte para mim não será tanto o estado de iluminação, mas sim o respeito por todas as coisas vivas (devaneio muito importante: eu adoro esta ideia, embora fizesse uma excepção gloriosa para as aranhas, brrr!!!). No entanto, as situações pouco credíveis que se sucedem no filme, com um encadeamento um tanto ou quanto ilógico, acabam por ferir a seriedade do que se pretendia fazer. Mas alguém acredita no seu perfeito juízo, a título meramente exemplificativo, nesta premissa: a) um casal americano de classe média-alta, pouco religioso, tem um único filho; b) aparecem-lhe à porta um grupo de monges; c) os monges afirmam que o filho poderá ser a reencarnação de um Lama falecido; d) apesar da descrença evidenciada, desde o início permitem sem razão aparente que o filho ande acompanhado pelos monges e se inicie nos trâmites budistas. Bem meus amigos, à velocidade e maneira que as coisas acontecem, isto não pega lá muito bem. Junte-se um Chris Isaak ensosso, sem alma e de trombas (deveria ter ficado pelas cantorias de “Wicked Game”) e o caldo entorna um pouco. Já agora, não parece um tanto ou quanto forçado que o Lama “Dorje” tenha afinal três reencarnações?!

No tocante à história de Siddhartha Gautama, existem aspectos mais cativantes, nem que seja pelo interesse da figura histórica em si. É extremamente interessante observarmos o evoluir de Siddhartha na sua epopeia pessoal da descoberta de um mundo desconhecido e incompreensível, até ao culminar do que é comummente conhecido como “iluminação”. O problema é que Keanu Reeves, nesta película não me parece ser um “ser” (passe a repetição, embora com significados distintos) que revele estar à altura da tarefa. O esforço existe, é certo, mas a interpretação tem algo de superficial que não se coaduna nada com a aura da película. As melhores prestações ficam a cargo de Bridget Fonda, que revela uma seriedade acima de quase todas a repreensões e cuja única crítica negativa de relevo não lhe poderá ser assacada. Porquê Bertolucci, no argumento, não fizeram o jovem “Jesse” ser acompanhado pela mãe, na sua viagem até ao Butão ?! Chris Isaak estava claramente a mais no segmento do filme que se passa na Ásia, e cuja presença de Bridget Fonda poderia ter dimensionado as coisas para um espectro completamente diferente no sentido positivo. Mesmo assim, o prémio para melhor actuação caberá a Ying Ruocheng. Uma presença calma e discretamente imponente, no papel de Lama “Norbu”, que nos contagia e prende a atenção . É ele o verdadeiro veículo transmissor da mensagem desta película, e o único que está verdadeiramente à altura do supostamente pretendido: a serenidade no partilhar de uma mensagem assaz positiva, que é o amor por todas as coisas vivas e a consequente compreensão pelo próximo. Maravilhosa a cena da sua meditação final...

Com uma composição agradável do mundialmente conhecido Ryuichi Sakamoto, “Pequeno Buda” tem a virtuosidade de nos introduzir de uma forma leve no interessante mundo do budismo, assim como nos oferece alguns momentos ímpares a nível de fotografia e música. No demais, trata-se de uma obra que acaba por cair na sua própria armadilha, ou seja, pugna por uma profundidade espiritual e acaba por enveredar por alguns trilhos pouco credíveis e, atrever-me-ia a afirmar, superficiais. Evidenciando mesmo assim um nível que catalogo à justa como bom, concluo que a nível de aproximação ocidental do budismo, acho que ainda não há nada como “Kundun” de Martin Scorcese. Este sim, continua a ser o rei dos que querem “cinematograficamente” aproximar-se daquela religião.

"De Siddhartha a Buda, o Iluminado"

Trailer (é mais um segmento emblemático), The Internet Movie Database (IMDb) link

Avaliação:

Entretenimento - 7

Interpretação - 7

Argumento - 7

Banda-sonora - 8

Guarda-roupa e adereços - 8

Emotividade - 8

Mérito artístico - 8

Gosto pessoal do "M.A.M." - 7

Classificação final: 7,50





2 comentários:

Nuno disse...

Amigo Jorge,

Ao tempo que vi o filme...terá uns 15 anos, e por isso, já me me esqueçi dos detalhes mas lembro-me que gostei na sua globalidade, até porque tinha lido, naquela altura, um livro sobre a vida do Príncipe Siddhartha, e o filme veio mesmo a calhar, porque é disso que trata. Focas bem o aspecto inicial quando te referes ao modo como o miúdo é "retirado" aos pais e estes aceitam a intromissão dos monges na sua vida, é de facto demasiado forçado. Como sou agnóstico, o problema da profundidade espiritual, ou a aproximação ocidental ao budismo não é muito relevante para mim, ainda que aceite que possam ser exploradas no filme. Já não me lembro. Lembro-me que é uma boa produção, que tem momentos de bom cinema e tem a Bridget Fonda ( como eu gostava daquela mulher).
Mais uma fantástica análise com umas fotos excelentes

Jorge Soares Aka Shinobi disse...

Olá Nuno!

Na globalidade, tenho uma opinião positiva do filme. No entanto, existem aspectos desta película que mereciam sem dúvida um tratamento melhor. Apesar de ser católico, sinto-me bastante atraído pela filosofia budista e pelos seus aspectos essenciais. Atendendo a este aspecto, das coisas que gosto mais no filme é precisamente a exposição destes ideais.

No restante, agradeço como sempre os elogios :) !

Grande abraço!