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segunda-feira, dezembro 01, 2008

Era Uma Vez na Índia/Once Upon a Time in India/Lagaan - लगान (2001)
Origem: Índia
Duração: 215 minutos
Realizador: Ashutosh Gowariker
Com: Aamir Khan, Gracy Singh, Rachel Shelley, Paul Blackthorne, Suhasini Mulay, Kulbhushan Kharbanda, Raghuvir Yadav, Rajendra Gupta, Rajesh Vivek, Shri Vallabh Vyas, Javed Khan, Rajendranath Zutshi, Akhilendra Mishra, Daya Shankar Pandey, Yashpal Sharma, Amin Hajee, Aditya Lakhia, A. K. Hangal, John Rowe, David Gant, Jeremy Child, Ben Nealon, Amin Gazi
"Bhuvan ladeado dos seus conterrâneos"

Sinopse

Em 1893, em pleno período vitoriano, a Índia é governada com mão-de-ferro pelos britânicos, num sociedade em que os marajás, outrora príncipes e reis poderosos, são apenas meras figuras decorativas. Numa província remota, o poder britânico é personificado no capitão “Andrew Russell” (Paul Blackthorne), um homem racista e arrogante, que espezinha os indianos, considerando-os seres inferiores. Eivado de um espírito autoritário e feudal, o capitão “Russel” aplica aos camponeses o dobro da quantia que costumam pagar a título de “lagaan”, a expressão que serve para designar o imposto sobre a terra, normalmente ressarcido em produtos agrícolas.

“Bhuvan” (Aamir Khan) é um jovem agricultor rebelde da aldeia de Champaner, que não vê com bons olhos a medida tomada por “Russel”, que inevitavelmente deflagrará a fome e a miséria pelo seu povo. Descobrindo que o capitão inglês é um fanático pelo cricket, “Bhuvan” acicata o orgulho de “Russel”, ao afirmar que o jogo é bastante fácil de praticar. “Russel” faz então uma aposta com “Bhuvan” cujos termos são os seguintes: num espaço de 3 meses, uma equipa da povoação local terá de enfrentar um conjunto composto pelos oficiais britânicos. Se vencerem, toda a província estará isenta do “lagaan” durante 3 anos; se perderem, todos os agricultores terão de pagar o triplo do imposto.

"Gauri"

“Bhuvan” começa a recrutar e a treinar a equipa para o confronto com os ingleses, mas as dificuldades são imensas, pois apercebem-se que o “cricket” não é tão fácil quanto isso. Contudo, recebem uma ajuda inesperada da irmã do seu oponente, “Elizabeth Russell” (Rachel Shelley) que revoltada com a injustiça da aposta, decide tomar partido e ajudar a equipa indiana. No meio de muitas privações e volte-faces, chega o dia em que através de um mero jogo, decidir-se-á o futuro a curto prazo de um povo.


"Elizabeth Russell"

"Review"

“Era Uma Vez na Índia”, ou somente “Lagaan”, foi um filme aclamadíssimo no seu país, tendo a sua fama ultrapassado fronteiras ao ponto de ter sido nomeado para o óscar de melhor filme estrangeiro, na edição de 2002 dos prémios da academia de Hollywood. Apenas dois filmes indianos tinham conseguido tal feito, sendo os outros “Mother India” (1957) e “Salaam Bombay!” (1989). Concorrendo contra “O Fabuloso Destino de Amélie”, a conhecida obra de Jean-Pierre Jeunet e principal favorito, estatueta acabaria por ser atribuída a “No Man's Land”, do bósnio Danis Tanovic, numa vitória que muitos acusaram ter natureza estritamente política. Independentemente destas considerações, “Lagaan” ganharia inúmeros prémios em certames de cinema, e não apenas na Índia. A aclamação no mundo da sétima arte, seria acompanhado pelo sucesso comercial, pois “Lagaan” bateria todos os recordes de venda de “dvd”, no que concerne a um filme de “Bollywood”, assim como entraria rapidamente no “top 10” do “box office” do Reino Unido, a que não será alheio o facto de existir naquela nação uma grande comunidade indiana e paquistanesa.

“Lagaan” é à partida uma longa, mas mesmo bastante longa-metragem (mais de três horas e meia de duração!!!) que tem os condimentos para agradar a tudo e todos. Possui um argumento que passeia pelos campos da intriga política, da história, do desporto, do amor, da amizade, da comédia salutar, da cultura e etnografia. Alie-se umas músicas bem conseguidas, não só as ligadas às tradicionais danças, mas igualmente aquelas cuja função é constituir o pano de fundo do desenrolar das cenas do filme, e temos uma base para algo positivo. Imagine-se que até nos é facultada a oportunidade de visionar os actores britânicos a participar com os indianos nas melodias, numa mescla bem conseguida onde tanto se debitam cantos em “hindi” como em inglês. O mundialmente conhecido A.R. Rahman, esse ícone mundial da “world music” e autor da banda-sonora desta película, presenteia-nos com um registo extremamente bem conseguido e apelativo aos nossos ouvidos.

“Lagaan” pretende ser a “história de uma batalha sem sangue”, como é apregoado nos cartazes que publicitaram o filme, um pouco por todo o mundo. Apesar de nos ser explicado no início da película, com um certo formalismo, que todos os eventos e personagens são ficcionais, poderíamos perfeitamente ser induzidos a pensar o contrário, e acreditarmos que estávamos perante um épico baseado em eventos reais embora algo romanceado. A sua envolvência no que toca aos aspectos mais pessoais e colectivos, em que observamos o quotidiano difícil de um povo dominado e pobre, que tem a oportunidade de se sublimar perante obstáculos aparentemente intransponíveis, assim nos leva a concluir. Não obstante, o filme por vezes exagera no pendor nacionalista, em que os ingleses com a excepção de Elizabeth, são vistos como “uns bebedores de chá” ostracizantes e em constante desrespeito pelo povo e cultura indianos. É uma forma de passar uma mensagem, que visa acentuar outra mais positiva que se reconduz à união de todos os indianos num desiderato comum. E esta premissa é claramente exposta quando vemos “Bhuvan”, o herói da trama, a acolher de braços abertos na equipa um muçulmano e um “sikh”, assim como desafia as convenções mais entranhadas a pugnar pelo recrutamento de um “intocável” com uma deficiência numa mão. O protagonista usa um argumento simples, mas bastante significativo. Como é que os indianos podem queixar-se do mau tratamento dos ingleses, se eles próprios, seja através da religião, ou de um rigoroso sistema de castas, discriminam-se uns aos outros. É com esta inteligência e perspicácia que, à semelhança de um Ghandi, “Bhuvan” engendra uma forma de luta não violenta, que passa por atingir os britânicos directamente no seu orgulho. O objectivo é vencê-los num campo que nem ousam sonhar perder, neste caso um dos seus desportos de eleição, o “cricket”. Mas poderia ser outro aspecto qualquer que estivesse em causa, desde que servisse para marcar uma posição. Pense-se na inevitável história de amor, em que nem os encantos naturais e bondade intrínseca da britânica “Elizabeth” conseguem vencer a indiana “Gauri”, na luta pelas atenções de “Bhuvan”. À europeia resta ficar só a vida toda a suspirar pelo seu enamorado indiano.

"A pouco convencional equipa de Champaner"

É relativamente fácil de concluir que “Lagaan” foi um filme que teve vários recursos financeiros e materiais à sua disposição, sendo até hoje a maior produção de sempre na história da meca do cinema indiano. O filme é visualmente poderoso, alicerçado numa fotografia de respeito onde nos é dado a conhecer vastas paisagens áridas de uma Índia desconhecida para quase todos nós. Junte-se os palácios dos marajás, as casas senhoriais inglesas, um guarda-roupa meticuloso e um interminável leque de actores e estão criadas as condições materiais para mais uma película que visa provar que a lenda é quase sempre maior do que a vida.

Os actores, embora cumpram o que lhes peçam, não se exibem todos em igual medida, muito por força da dispersão dos papéis num grande número de intervenientes. Mesmo assim, sempre se dirá que Aamir Khan demnstra o carisma que lhe é inato. Não é segredo que estamos perante um dos mais sensacionais actores de “Bollywood”, se não mesmo o mais competente actualmente. Gracy Singh faz praticamente a sua estreia numa grande produção, e embora se esforce, há que reconhecer que ainda tinha muito que calcorrear para chegar ao nível de uma Kareena Kapoor, de uma Preity Zinta ou de uma Aishwarya Rai. No que concerne à falange britânica presente na película, é necessário desde logo afirmar que o cinema de “Bollywood” ainda não é suficientemente atractivo para capitalizar grandes nomes ingleses, pelo que invariavelmente se recorre a figuras desconhecidas. Falando de Rachel Shelley e Paul Blachthorne, os que assumem mais despesas nesta longa-metragem, ambos são actores de séries ou filmes desconhecidos. Muito provavelmente, “Lagaan” constituirá o expoente máximo nas suas carreiras. O seu desempenho é aceitável, embora longe de ser brilhante. Como aspecto lateral, sempre se dirá que a actriz britânica é lindíssima, e possui uns olhos que petrificam qualquer um...

“Lagaan” é uma película de excelente qualidade que teve, entre outros méritos, o de chamar a atenção para a cinematografia de “Bollywood” no ocidente, provando de uma vez por todas que na Índia também residem obras de grande envergadura cinematográfica. Apesar de ser uma longa-metragem bastante extensa, o seu ritmo contagiante faz com que as mais de três horas e meia de filme decorram num ápice, nunca entediando o espectador. Transmite uma mensagem assaz positiva e que passa muito pela ideia de sermos nós os deuses que controlam o nosso destino. Contudo, na minha ainda curta deambulação pelas obras daquele país, confesso que já tive a oportunidade de visionar películas que, por mais inverosímel que pareça, são superiores. Pelo exposto, sempre se poderá questionar com alguma acuidade, o porquê de mais filmes provenientes da Índia não terem uma presença constante nos grandes certames de cinema do mundo. Já é tempo de ultrapassar o trauma de que tudo o que provém daquelas paragens está conotado com o signo do “rasca”. Eu, aos poucos, já o estou a fazer. E sinto-me feliz por isso, pois é sinal que os meus horizontes cinematográficos evoluíram e subsequentemente estão a tornar-se mais vastos.

A não perder!


"Bhuvan e Gauri"

Trailer - música "Chale Chalo"

The Internet Movie Database (IMDb) link

Outras críticas em português:

Avaliação:

Entretenimento - 8

Interpretação - 7

Argumento - 8

Banda-sonora - 9

Guarda-roupa e adereços - 8

Emotividade - 9

Mérito artístico - 8

Gosto pessoal do "M.A.M." - 8

Classificação final: 8,13





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