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quarta-feira, setembro 24, 2008

Padrinhos de Tóquio/Tokyo Godfathers/Tokyo Godofâzâzu - 東京ゴッドファーザーズ (2003)

Origem: Japão

Duração: 88 minutos

Realizador: Satoshi Kon

Vozes das personagens principais (versão japonesa): Tôru Emori, Yoshiaki Umegaki, Aya Okamoto, Satomi Kôrogi, Shôzô Lizuka, Seizô Kato, Hiroya Ishimaru, Riûji Saikachi, Yûsaku Yara, Kyôko Terase, Mamiko Noto

"Da esquerda para a direita, Hana, Miyuki e Gin"

Sinopse

“Gin”, um alcoólico que perdeu a família devido ao seu vício no jogo, “Hana”, um homossexual que costumava trabalhar num bar gay e “Miyuki”, uma rapariga fugitiva filha de um polícia, são três sem-abrigo que deambulam conjuntamente pelas ruas de Tóquio. Na noite de Natal, enquanto vasculham o lixo, encontram um recém-nascido supostamente abandonado. Os amigos sabem que não estão em condições de cuidar do bebé e com base em pistas que se encontravam com a criança, decidem ir à procura dos pais de “Kiyoko”, o nome que foi atribuído à menina, significando o mesmo “criança pura”.

"A bebé Kiyoko"

Inicia-se então uma aventura cujo palco são as ruas da grande cidade, e que irá pôr a nu os anseios e frustrações de “Gin”, “Hana” e “Miyuki”. Tal fará com que mais do que uma busca para descobrir os progenitores de “Kiyoko”, esteja em causa uma demanda que fará com que cada um dos intervenientes se descubra a si próprio, procurando uma esperança para um futuro que não se afigurava risonho.

"Perseguição de táxi"

"Review"

Não é segredo para ninguém que, ao contrário do que se passa por exemplo frequentemente nos E.U.A., os japoneses usam a animação de uma forma bastante versátil. Não apenas são realizados filmes para um público mais infantil, como uma grande fatia dos produtos de “anime” são voltados para a faixa etária adolescente e até mesmo adulta. Sejamos sinceros. A animação possibilita ultrapassarmos certo tipo de fronteiras, que as películas com actores de “carne e osso” não conseguem, embora se reconheça que os limites estão cada vez mais esbatidos, e a uma grande velocidade! Vagamente baseado em “3 Godfathers”, um "western" sentimental de John Ford que remonta a 1948 (“Três Homens e Um Bebé”, de Leonard Nimoy também viria aqui buscar alguma inspiração), “Padrinhos de Tóquio” é mais uma dessas longas-metragens dirigidas aos espectadores mais crescidos, devido a um conjunto de temas abordados de forma directa ou indirecta na trama, tais como a homossexualidade, o alcoolismo, a degradação humana, entre muitos outros que serão mais perceptíveis e até aconselháveis a um discernimento mais amadurecido.

Quem costuma frequentar este espaço (nunca é demais agradecer a amabilidade por tal facto), sabe perfeitamente a admiração que nutro por Satoshi Kon. A sua obra “Millennium Actress” é de uma dimensão superior, merecendo estar colocada naquele panteão divino onde só meia-dúzia de películas esplendorosas têm lugar. O resto da sua cinematografia situa-se num plano bastante elevado, embora não ao nível da longa-metragem supra citada. Como já disse anteriormente no “My Asian Movies”, é minha firme convicção que Satoshi Kon com mais 3 ou 4 filmes do nível dos que realizou até agora, poderá aspirar à grandeza de um Miyazaki, embora as suas películas de animação situem-se num plano completamente distinto do mestre japonês. É necessário admitir que os “animes” de Kon não serão tão apelativos para o público em geral, e por essa razão tenham mais dificuldade em se implantar no mercado. No entanto, e depois de nos habituarmos ao estilo próprio do realizador nipónico, forçosamente iremos concluir que o génio está todo lá e que possui as condições necessárias para triunfar. “Padrinhos de Tóquio” é mais um aspecto intimista desta faceta maravilhosa que Kon possui e que passa por saber contar uma história, cheia de personagens peculiares, mas que ficam gravadas na memória.

"Gin acarinha Kiyoko"

Embora o argumento esteja centrado na nobre busca dos pais de uma recém-nascida, a amplitude argumentativa “Padrinhos de Tóquio” vai muito mais além do que isso. É abordado de uma forma séria um drama social de que nenhum país está livre, o problema dos sem-abrigo. Aqui somos confrontados com um grupo de pessoas que em tempos tiveram vidas normais (com a excepção de “Hana”) e felizes, que por algum acaso da vida foram parar no meio das ruas, sem esperança alguma de futuro, ora refugiando-se no álcool, ora lutando pela sobrevivência nos becos, vielas e caixotes do lixo de Tóquio. Mas Kon superiormente não envereda pelo drama fácil "da lágrima rápida no olho". Pelo contrário, tem o engenho de temperar a película com elementos cómicos que põem sorrisos nas nossas faces. O jogo sentimental entre a tristeza e a alegria, é uma das características mais marcantes dos produtos de Kon, e aqui o realizador demonstra-o mais uma vez, fazendo com o que o nosso estado de espírito seja muito volúvel durante o visionamento desta obra. Interessante e por vezes não tão evidente, são as analogias que podemos estabelecer com o próprio conceito de Natal, de um ponto de vista religioso. O bebé “Kiyoko” funciona um pouco como o menino Jesus. Encontrado na altura da grande festa, é o catalisador para tudo o que a seguir sucede na história. Com os “três reis magos” (prefiro esta interpretação pessoal, àquela outra que estabelece paralelos entre "Hana" e a Virgem Maria) mais improváveis do mundo, a magia de uma noite de Natal acaba por acontecer, e o epílogo é um tanto ou quanto prova disso. Não revelo mais, pois tal constituiria um “spoiler”.

O registo de animação é cuidado, do qual se destacam os cenários de Tóquio, em especial a zona de Shinjuku , conhecida pelos seus imponentes arranha-céus. Se nunca estiveram no Japão como eu (infelizmente...), basta fazerem um simples exercício que eu próprio realizei e que passou por confrontar cenários do filme com fotografias das zonas da capital nipónica que a película tenta ilustrar. É certo que “Padrinhos de Tóquio” neste particular não deslumbra como as obras de Miyazaki. Contudo, o realismo incutido em certas fases da animação, aliados aos próprios temas tratados na obra, já mereceu algumas perguntas pertinentes das quais se destaca “Porquê não fazer então um filme real? Porquê que Satoshi Kon não se aventura naquele tipo de cinema?” Bem, esta é uma resposta que só o realizador poderá dar.

“Padrinhos de Tóquio” tem vários méritos que merecem ser destacados e que o elevam recorrendo a outros artifícios, que não passam propriamente apenas pela animação. Elege como heróis pessoas que normalmente são olhadas de soslaio como párias da sociedade, evidenciando sem complexos o factor humano como seu atributo principal. Na decorrência disto, torna-se numa película poderosa, que demonstra a força do amor mesmo nas situações mais estranhas e pouco convencionais. Mas acima de tudo, transmite uma mensagem de esperança e de redenção nos momentos mais dramáticos e que à partida não parecem ter solução. Deste conto de Natal pouco convencional, sempre se extrairá que a magia e muito do que de bom existe no mundo, reside quase sempre nas mãos de uma criança. E já agora, em cada um de nós, mesmo que do exterior não transpareça e seja necessário procurar lá bem no fundo. Ah, e nunca esquecer a seguinte premissa: o lar é onde o nosso coração está...

Parabéns Satoshi Kon, por um conto de Natal nada comum, mas bastante significativo!

"O Inverno em Tóquio"

Trailer, The Internet Movie Database (IMDb) link

Outras críticas em português:

Avaliação:

Entretenimento - 8

Animação - 8

Argumento - 9

Banda-sonora - 7

Emotividade - 9

Mérito artístico - 8

Gosto pessoal do "M.A.M." - 8

Classificação final: 8,14





2 comentários:

Anónimo disse...

Sem dúvida! Apesar de todas aquelas improbabilidades narrativas (que tornam aquele frenético final quase mais plausível), o trio tão insólito faz com que a experiência seja bastante agradável! E a temática dos sem-abrigo é bem mais pertinente do que à partida se poderia pensar num pais como o Japão. Mas mais do que essas "mensagens" o que mais me recordo do filme é mesmo o seu primoroso sentido de humor que equilibrou muito bem o ambiente! Vale a pena testemunhar as aventuras e desventuras daquele trio tão castiço!

Abraço!

Jorge Soares Aka Shinobi disse...

Olá tf10!

Pois, eu apesar de nunca ter ido ao Japão, já tomei contacto com alguma informação no que toca aos sem-abrigo naquele país e a situação afigura-se preocupante. Infelizmente é um problema transversal a quase todos os países.
"Padrinhos de Tóquio" tem um cunho forte no que toca às tais "mensagens". É sempre uma característica que aprecio imenso nos filmes em geral. Contudo, e como dizes e bem, o sentido de humor é primoroso.
Acho que Kon conseguiu dosear bem as duas coisas e aí é que reside um dos seus principais méritos nesta película!

Abração!